sexta-feira, 4 de abril de 2014

"Jardim do Lago, árvore n.º 5, 2.º ramo frente" #7

Os dias têm sido um pouco cinzentos e no Jardim do Lago também chove...


Episódio 7

Se é certo que a vida se compõe de felicidades e de mágoas, no Jardim do Lago, como em qualquer lugar, nem sempre o sol brilhava, fora e dentro dos que aí viviam. Alguns dias eram de alegria, quase um paraíso terrestre de beleza e harmonia. Mas, por vezes, as plantas pareciam ter perdido o viço e a cor. Ressentidos, os passarinhos mais cantadores esqueciam então as melodias que animavam o jardim.
Na manhã seguinte ao nascimento dos pequenos cisnes, os moradores do Jardim do Lago começavam, pouco a pouco, a acordar de uma noite húmida e fria. O sol nascia a medo e um véu opaco teimava em esconder o céu. Os animaizinhos iam espreitando o alvor, curiosos. As plantas, da majestosa árvore à mais pequenina erva, todas mantinham a esperança de secar o orvalho que pousara sobre folhas e pétalas.
Joaninha abriu os olhinhos minúsculos e reparou que a amiga Joana não estava na cama, a folhinha do costume, ao lado da sua. No ramo ao lado, viu o gafanhoto Valentim, ainda meio ensonado. E ouviu os vizinhos pardais, agitando as asas, preparados para o primeiro voo do dia.
Joaninha pensou que talvez Joana tivesse acordado mais cedo. O seu pensamento foi logo desmentido por uma vozinha muito sumida, vinda da base do tronco da árvore número cinco. Era um “ai” queixoso e repetido...
Num voo urgente, Joaninha aproximou-se do solo, olhou em volta e descobriu o que procurava: sobre uma folha seca caída na relva, Joana, de patinhas para o ar, rodava e esperneava, num lamento contínuo e vagaroso. Valentim também fora atraído pelo pranto da amiguinha e aproximara-se.
– Joana, estás doente? Diz-nos o que aconteceu... Vamos ajudar-te a virar. Força, Valentim, dá uma patinha!
Joana não respondia, só dizia baixinho “ai... ai...”. Desgostosos, os amigos perceberam que ela não iria viver por muito mais tempo e que a única coisa a fazer seria ficarem ali, junto dela, em silêncio. Talvez a sua presença amiga fosse reconfortante para o insetozinho moribundo. Era a última prova de amizade que podiam oferecer-lhe. Ouviram, de novo, um “ai...”, ainda mais desfalecido. Viram-na fechar os olhinhos e ficar imóvel, na suave doçura de quem adormece. Só que desta vez não iria acordar.
Uma chuva miudinha começou a cair sobre a relva. Joaninha e Valentim pensaram que a natureza estava triste, que chorava, como eles, a partida de Joana. Era apenas um insetozinho, é verdade que há milhões de insetos, mas para a natureza, mãe de todos, cada filho é especial.

(continua)
J. M.

Sem comentários:

Enviar um comentário